21 de nov. de 2010

Violação não é adultério

 

Por Reem Abbas, da IPS
Cartum, Sudão

As violações de mulheres na região sudanesa de Darfur são sistemáticas desde o começo da guerra civil em 2003. A não governamental Aliança 149 realiza uma campanha para reformar a lei que confunde esse crime com o de adultério. O artigo 149 do Código Penal de 1991 define a violação como “zina”, a relação sexual entre um homem e uma mulher que não são casados entre si, mas sem consentimento.

Além disso, a lei obriga a mulher a apresentar quatro testemunhas homens para provar que foi “sem consentimento”. Se ela denunciar uma violação e não puder apresentar essas provas, será acusada de adultério e castigada com cem chicotadas, se for solteira, ou apedrejada, se for casada. “A reforma será muito boa para as sudanesas porque permitirá separar adultério de violação. O agressor será punido com uma longa condenação”, disse Amro Kamal, advogado voluntário do Monitor de Direitos Humanos do Sudão e membro da direção da Aliança 149.

“Supõe que o Código Penal sudanês esteja baseado na shariá (lei islâmica), mas o problema é que o artigo 149 não distingue entre zina e violação, e isso é ruim e anti-islâmico”, explicou Amro. O caso de Darfur precisa de um enfoque diferente. Os problemas nessa região, reino independente anexado pelo Sudão em 1917, começaram na década de 1970 com uma disputa por terras de pastoreio entre nômades árabes e agricultores indígenas negros.

Esse conflito derivou em uma guerra civil em fevereiro de 2003, quando guerrilheiros negros responderam com violência às hostilidades praticadas pelas milícias Janjaweed (homens a cavalo). Os Janjaweed, apoiados por Cartum, são acusados de realizar uma campanha de limpeza étnica contra três tribos negras que apoiam as organizações guerrilheiras. Os combatentes são considerados responsáveis pelas mortes de 300 mil pessoas e do deslocamento de dois milhões.

A Aliança sugere que seja adotado o direito humanitário internacional para abordar as necessidades das vítimas de Darfur. As mulheres vivem com o medo permanente de serem violadas e expulsas de suas comunidades. Muitas devem abandonar suas casas e partir para acampamentos montados pelo governo, onde algumas permanecem durante anos. “Não é fácil para uma mulher violada viver em nossa comunidade, especialmente quando fica grávida. O entorno não aceita o bebê”, disse Mahbouba Abdur Rahman Ali, da Organização de Empoderamento de Mulheres.

O Acordo Integral de Paz, que em 2005 pôs fim ao conflito de 21 anos entre o Norte, de maioria muçulmana, e o Sul, de negros cristãos, exige uma reforma legal para ajustar-se aos padrões internacionais de direitos humanos, segundo a Aliança. “O Sudão não é signatário da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres”, disse à IPS uma fonte da Unidade Infantil e da Família. “Isso dificulta o trabalho de reformar a lei porque não há nenhum responsável pelos assuntos femininos”, acrescentou.

A Aliança 149 está atraindo a atenção dos legisladores. Quando lançou a campanha, em janeiro, reuniu funcionários do Ministério de Assuntos do Interior, da política, parlamentares e representantes de partidos políticos. “Foi sensacional ver organizações de mulheres e representantes reunidos por uma grande causa”, disse Fahima Hashim, integrante da direção da Aliança e diretora do Centro Salmmah de Recursos das Mulheres.
Envolverde/IPS
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Um comentário:

  1. Que estas mulheres , breve, encontrem sua verdadeira identidade. É muito cruel a vida que vivem.
    Laiz de Braga- RO

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